quinta-feira, 7 de abril de 2011

Uma Breve Descrição da Psicanálise

“UMA BREVE DESCRIÇÃO DA PSICANÁLISE”
RESUMO

Freud, Sigmund. Uma breve descrição da psicanálise (1924 [1923]) in: Freud, Sigmund. O ego e o Id e outros trabalhos, (1923-1925) in Obras completas de Sigmund Freud (23 v.), V.19. RJ, Imago, 1996

O presente resumo objetiva fazer uma abordagem dos pontos principais do texto escrito por em 1923 e1924, intitulado “Uma breve descrição da psicanálise”. Nesta obra em que Freud encontramos um relato sobre a etiologia da psicanálise, o marco de seu nascimento e os fatores necessários para o mesmo como as experiências de Jean Sartre Charcot, Pierre Janet e Josef Breur.
            Freud discorre também sobre a resistência e hostilidade que a psicanálise encontrou desde o seu surgimento por ir de encontro a conceitos enraizados e por ferir crenças em pontos sensíveis da sociedade “civilizada”. O texto ainda contempla a mudança no método de tratamento, da hipnose para a associação livre (que afinal de contas não seria tão livre assim) abordando também os motivos pelos quais essa transformação se deu.
           

            Pensando a psicanálise

            Para Sigmund Freud é possível afirmar que a psicanálise nasceu com o século XX a partir da publicação da obra que teve alcance mundial: A Interpretação de Sonhos, em 1900. Ele reconhece, no entanto, que essa obra só foi possível porque foi precedida por ideias antigas surgidas com objetivo específico de entender as chamadas doenças nervosas funcionais. Até então os médicos não sabiam o que fazer com o fator psíquico e como não podiam entendê-lo, deixavam-no aos filósofos, aos místicos e aos charlatões considerando-o não científico.
Freud relata que em 1885, quando estudava na Salpêtrière, havia pessoas diziam que as paralisias eram fundadas em ligeiros distúrbios funcionais das partes correspondentes do cérebro. A incompreensão do fenômeno levava à prática de tratamentos inadequadas como prescrição de remédios e aplicação de influências mentais por meio de ameaças, zombarias e advertências. Freud refere-se a esses tratamentos como métodos fantasiosos usados em uma ciência que afirmava ser exata.
A transformação desse quadro de pensamento restrito ocorre na década de 1880, quando os fenômenos do hipnotismo fazem mais uma tentativa de ingressar na ciência médica. Dessa vez, graças ao trabalho de Liébeault, Bernheim, Heidenhain e Forel foi possível demonstrar que mudanças somáticas podiam ser ocasionadas unicamente por influências mentais ocasionadas pelo próprio indivíduo e também que a existência de determinados processos mentais só poderiam ser descritos como inconscientes. O hipnotismo tornava concreto e sujeito à experimentação o que antes estivera em discussão no campo teórico entre os filósofos.

A hipnose

Freud destaca a importância do papel desempenhado pelo hipnotismo na origem da psicanálise, tanto na teoria quanto na prática. A hipnose também foi um auxílio valioso no estudo das neuroses. Os experimentos do medico parisiense Jean Sartre Charcot foram impactantes, pois ele demonstrou que, pela sugestão de um trauma sob hipnose era possível provocar artificialmente os mesmos sintomas. Assim surge a idéias de que as influências traumáticas poderiam originar os sintomas histéricos.

Josef Breuer e a Histeria

Apesar dos avanços nas descobertas, Charcot não fez outros esforços no sentido de uma compreensão psicológica da histeria. Foi seu aluno, Pierre Janet quem demonstrou, com o auxílio da hipnose, que os sintomas da histeria eram firmemente dependentes de certos pensamentos inconscientes. No entanto, o nascimento da psicanálise não se baseou nas pesquisas de Janet, mas sim na experiência de um médico vienense, o Dr. Josef Breuer. 
Em 1881, através da hipnose, Breuer estudou e restituiu à saúde de uma jovem que sofria de histeria. A jovem era Bertha Pappenheim que ficara doente enquanto cuidava de seu pai e Breuer identificou que seus sintomas estavam relacionados a esse período. Foi assim que, pela primeira vez demonstrou-se que os sintomas da neurose tinham significado na vida emocional, tomando lugar de ações não efetuadas. Para explicar surgimento dos sintomas histéricos duas abordagens foram estabelecidas e ainda hoje são consideradas: a relação com a vida emocional do indivíduo e a ação recíproca de forças. As causas dos sintomas e todos os impulsos mentais que delas se originavam estavam perdidos para a memória da paciente, como se jamais houvessem acontecido. Apenas os sintomas persistiam inalterados e aí residia a prova da existência de processos mentais inconscientes.
Freud no começo da década de 1890 confirmou os resultados de Breuer em outros pacientes e, juntos, publicaram “Estudos sobre Histeria” (1895) com os referidos resultados e tentativas de formulação de uma teoria a partir dos mesmos.  Esta teoria apregoava que os sintomas histéricos surgiam quando um afeto era desviado de sua manifestação normal. A cura ocorria quando a experiência era revivida sob hipnose e ao se dar outra direção ao afeto o indivíduo se via livre dele. Esse procedimento foi denominado método catártico e foi o precursor imediato da psicanálise.

            Rompimento entre Freud e Breuer

A associação entre Breuer e Freud terminou logo após a publicação de “Estudos sobre a Histeria”. Freud introduziu novidades técnicas e as descobertas que efetuou transformaram o método catártico em psicanálise, esta praticada sem a hipnose. O abandono da hipnose ocorreu por duas razões: em primeiro lugar porque Freud não conseguia induzir a hipnose em um número suficiente de casos, e, em segundo, porque estava insatisfeito com os resultados terapêuticos da catarse obtida com a hipnose.
O método da associação livre foi desenvolvido por Freud como substituto da hipnose. Neste método os pacientes assumiam o compromisso de se abandonarem em um estado de tranqüila concentração, para verbalizar as idéias que espontaneamente lhe ocorressem. Essas idéias pareceriam ser determinadas pelo material inconsciente e embora não fossem o material esquecido, faziam alusão aos mesmos e eram passíveis de interpretação.
A resistência dos pacientes em comunicar as idéias que lhe ocorriam levou a uma das pedras angulares da teoria psicanalítica das neuroses — a teoria da repressão. A informação traumática, através da influência de outras forças mentais tinha-se defrontado com uma repressão que a barrara ao inconsciente e é em consequência dessa repressão que se manifestava por caminhos fora do comum, tais como os sintomas. Essa repressão era feita pelo consciente por motivos morais, estéticos e éticos, para encobrir impulsos de egoísmo, crueldade e acima de tudo impulsos desejosos sexuais. Esse processo evidenciou ainda mais a enorme influência dos impulsos sexuais na vida mental e levou a um estudo pormenorizado da natureza e desenvolvimento do instinto sexual trazendo a discussão algo negligenciado pela ciência: a sexualidade infantil.

E nasce a Psicanálise

Freud enumerou os fatores que contribuem para a constituição dessa teoria psicanalítica: ênfase na vida afetiva, na dinâmica mental, no fato de que mesmo os fenômenos mentais aparentemente mais obscuros e arbitrários possuem invariavelmente um significado e uma causa, a teoria do conflito psíquico e da natureza patogênica da repressão, a visão de que os sintomas constituem satisfações substitutas, o reconhecimento da importância etiológica da vida sexual, e especificamente, dos primórdios da sexualidade infantil. Freud acrescentou ainda a complicada relação emocional das crianças com os pais, definida por ele como Complexo de Édipo, considerando-o o núcleo de todo caso de neurose. Foi devido a esses fatores que a psicanálise provocou repugnância e ceticismo em estranhos.
            Surge uma premissa: se as condições postuladas pela psicanálise realmente existissem, elas deveriam ser capazes de encontrar expressão noutros fenômenos, além dos histéricos. Destarte a psicanálise teria cessado de ter interesse apenas para os neurologistas e passaria a ter atenção de todos para quem a pesquisa psicológica tivesse alguma importância. Surgiu assim provas de sua utilidade sobre outras atividades mentais como as parapraxias (esquecer coisas, lapsos de língua e colocação errada de objetos) e os sonhos. Ambos fenômenos comuns á pessoas normais e nunca antes explicados por nenhuma teoria.
A frequência de parapraxias facilitou o convencimento das pessoas sobre o fenômeno. A análise dos sonhos com a obra A Interpretação de Sonhos, demonstrava serem os sonhos construídos exatamente da mesma maneira que os sintomas neuróticos, sendo manifestações de impulsos desejosos que se apresenta como realizado no sonho. Essas manifestações são deformadas pelas forças censurantes e restritivas. A partir da data de “A Interpretação de Sonhos”, a psicanálise passou a constitui não apenas um novo método de tratar as neuroses, mas também uma nova psicologia.
            Apesar de todas as evidências apresentadas os trabalhos e Freud não receberam muita atenção até 1907 quando um grupo de psiquiatras suíços (Bleuler e Jung, em Zurique) atraiu a atenção para a psicanálise. A rejeição permanecia, mas sem conseguir impedir a psicanálise de uma expansão contínua durante a década seguinte em novos países (principalmente nos Estados Unidos) e encontrando aplicações em novos ramos do conhecimento.  Nesse período também os primeiro periódicos dedicados exclusivamente à psicanálise foram fundados.
Uma diferença essencial entre essa segunda década da psicanálise e a primeira reside no fato de que Freud não constituía mais seu único representante. Um círculo de adeptos se dedicou à difusão e aprofundamento das teorias psicanalíticas surgindo, deste modo, algumas oposições. Entre 1911 e 1913, C. G. Jung, em Zurique, e Alfred Adler, em Viena, produziram determinada agitação por suas tentativas de dar novas interpretações aos fatos da análise e por seus esforços para um desvio do ponto de vista analítico.
A ruidosa rejeição da psicanálise pelo mundo médico não podia impedir seus defensores de desenvolvê-la. Seu inegável sucesso terapêutico, que excedia em muito qualquer outro que houvesse sido anteriormente conseguido, incentivaram-nos constantemente a novos esforços, ao passo que as dificuldades reveladas à medida que o material era examinado mais profundamente redundaram em alterações profundas na técnica da análise e correções importantes em sua teoria. A fundação de uma primeira clínica psicanalítica para pacientes externos (por Max Eitingon, em Berlim, em 1920) tornou-se, portanto, um passo de grande importância prática. O intento era buscar, por um lado, tornar o tratamento analítico acessível a amplos círculos da população e, por outro, empreende a instrução de médicos para serem analistas clínicos através de um curso de formação incluindo como condição que aquele que aprende concorde em ser ele próprio analisado.
Entre os conceitos hipotéticos que capacitem o médico a lidar com o material analítico, o primeiro a ser mencionado é o da ‘libido’, no sentido da força dos instintos sexuais dirigidos para um objeto. Um estudo demonstrou que era necessário colocar ao lado dessa ‘libido objetal’ uma ‘libido narcísica’ ou ‘do ego’, dirigida para o próprio ego do indivíduo, e a interação dessas duas forças nos capacitou a explicar grande número de processos normais e anormais na vida mental.  A visão psicanalítica também teria de incluir nos distúrbios narcísicos todas as moléstias descritas em psiquiatria como ‘psicoses funcionais’. Não se poderia duvidar de que as neuroses e psicoses não estão separadas por uma linha rígida, mais do que o estão a saúde e a neurose, e era plausível explicar os misteriosos fenômenos psicóticos pelas descobertas a que se chegou nas neuroses, que até então haviam sido igualmente incompreensíveis. A psiquiatria tornou-se assim o primeiro campo a que a psicanálise foi aplicada e desse modo permaneceu desde então.
Se as descobertas psicológicas obtidas dos sonhos fossem firmemente lembradas, só outro passo era necessário antes que a psicanálise pudesse ser proclamada como a teoria dos processos mentais mais profundos não diretamente acessíveis à consciência e assim pudesse ser aplicada a quase todas as ciências mentais. Esse passo residia na transição da atividade mental de homens individuais para as funções psíquicas de comunidades humanas e povos, isto é, da psicologia individual para a de grupo. Algumas considerações levavam a isso como, por exemplo, a descoberta de que nos estratos profundos da atividade mental inconsciente os contrários não se distinguem um do outro, mas são expressos pelo mesmo elemento. Esta relação pode ser identificada em algumas línguas mais antigas que se referiam aos contrários usando a mesma palavra.  Um outro ponto considerado foi a correspondência perfeita que pode ser descoberta entre as ações obsessivas de certos pacientes obsessivos e as observâncias religiosas dos crentes em todo o mundo. Certos casos de neurose obsessiva na realidade se comportam como uma caricatura de uma religião particular. Assim a psicanálise mais uma vez fere conceitos enraizados e causa hostilidade.
Sendo possível estabelecer que os aspectos mais gerais da vida mental inconsciente estão presentes em toda parte, e se há uma psicologia profunda que conduz a um conhecimento desses aspectos, podemos então esperar que a aplicação da psicanálise às mais variadas esferas da atividade mental humana. Em um estudo excepcionalmente valioso, Otto Rank e Hanns Sachs (1913) tentaram reunir o que o trabalho da psicanálise pôde conseguir até aquele momento no sentido do preenchimento dessas expectativas.
            Se deixarmos fora de cogitação impulsos internos pouco conhecidos, podemos dizer que a principal força motivadora no sentido do desenvolvimento cultural do homem foi a exigência externa real, que retirou dele a satisfação fácil de suas necessidades naturais e o expôs a perigos imensos. Essas necessidades naturais incluem impulsos instintivos impossíveis de ser socialmente satisfeitos. Com os avanços ulteriores da civilização cresceram também as exigências da repressão.
            Além dessa parte da atividade mental humana que é orientada no sentido de obter controle sobre o mundo externo real, a psicanálise mostra uma outra parte, particular e altamente prezada, do trabalho mental criativo serve para a realização de desejos Entre essas criações, cuja vinculação com um inconsciente incompreensível sempre foi suspeitada, estão os mitos e as obras da literatura imaginativa e da arte. A apreciação estética de obras de arte e a elucidação do dote artístico não estão, é verdade, entre as tarefas atribuídas à psicanálise. Mas parece que a psicanálise está em posição de enunciar a palavra decisiva em todas as questões que afloram a vida imaginativa do homem.
            A psicanálise nos demonstrou ainda, a importância do papel desempenhado pelo que é conhecido por ‘complexo de Édipo’ na vida mental dos seres humanos. Compreendemos o complexo de Édipo como correlativo psíquico de dois fatos biológicos fundamentais: o longo período de dependência da criança humana e a maneira notável pela qual sua vida sexual atinge um primeiro clímax do terceiro ao quinto ano de vida,e depois, passado um período de inibição, reinicia-se na puberdade.
          Freud finaliza seu texto prenunciando que a psicanálise ingressaria no desenvolvimento cultural das décadas seguintes, aprofundando os conhecimentos até então (1924) obtidos e ajudando a combater “algumas coisas da vida reconhecidas como prejudiciais”. Freud afirma ainda que a psicanálise não pode, sozinha, explicar todas as coisas, mas pode fazer importante contribuições para os mais diversos campos de conhecimento.

3 comentários:

  1. Li esse texto como quem passeia, amiga!
    Excelente!
    Beijos!

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  2. Realmente muito explicativo,bem fácil de ler e entender...
    Adorei.

    :D

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  3. Pela qualidade dos textos bastaram-me 2 leituras para já ficar fã do site. Coloquei em meus favoritos. Ótima qualidade. Abraços do Jorge Sunny. Me leiam também em http://recantodasletras.com.br/autores/ jsunny ( sunny é meu "nick" e se refera o SOL do Rio de Janeiro ( Cidade ) onde moro.Abraços mui de bem com a vida e terapêuticos !...

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