sábado, 25 de fevereiro de 2012

Filme O ARTISTA




Um filme mudo e em preto e branco em tempos de cinema 3D. Uma fórmula que caiu em desuso há mais de 80 anos se mostrou ainda capaz de fascinar o mundo. O Artista é simples, poético, inocente, cativante do inicio ao fim. É um daqueles filmes que quando chega ao final dá vontade de assistir de novo.

O filme conta a história de um famoso ator do cinema mudo George Valentin (Jean Dujardin) que vê sua carreira entrar em decadência com o surgimento do cinema falado. Ele é um artista de sorrisos, caretas e trejeitos, um artista da linguagem corporal, não da fala. Ao mesmo tempo em que sua carreira declina ele vê a ascensão da jovem dançaria Peppy Miller (Bérénice Bejo) que era apenas uma fã e figurante em seus filmes.

O tema não é novo. Cantando na Chuva já tinha mostrado o dilema dos astros do cinema mudo tentando adaptar-se a nova realidade. Mas O Artista consegue encantar pela profundidade com que aborda a angústia do seu personagem central, que vê tudo ao seu redor começar a produzir sons enquanto ele não consegue falar. A cena em que ele se assusta com o barulho dos objetos que ele coloca sobre a mesa é uma daquelas que se eternizam.

A paixão entre George Valentin e Peppy Miller prevalece o filme inteiro, mas de forma doce, nunca roubando a atenção do dilema central do personagem. A cena inicial em que George erra a interpretação várias vezes só pra dançar mais tempo com ela é de uma sutileza e de uma graça incrível. O cão Uggie, ao lado de Valentin todo o tempo é apaixonante e corrobora com a mensagem do filme. Em um das cenas uma senhora se encanta com o cão e tece mil elogios, ao que Valentin responde “mas ele não fala”. Acho que esse é o ponto forte do filme, tudo se encaixa perfeitamente. Nada sobra, nada falta.

Dirigido brilhantemente pelo desconhecido Michel Hazanaviciu o filme tem outros atributos, os figurinos bem escolhidos, uma fotografia cheia de contrastes e a trilha sonora que dispensa, literalmente, palavras. Não estou bem certa de que quem nunca assistiu ao cinema mudo, viverá com O Artista essa experiência de encantamento, mas pra mim que assistia Chaplin aos 10 anos, de madrugada com a tv no mudo para não ser flagrada, assistir O Artista foi como reencontrar um velho amigo que julgava morto e perceber que ele continua tão fascinante quanto antes.

Assim como Hugo Cabret essa é outra obra metalinguística e, do mesmo modo, uma homenagem aos primórdios do cinema. Enquanto o norte-americano Scorsese homenageia o cinema francês o cineasta francês homenageia Hollywood. The Artist é filme é encantador, charmoso, puro, bonito, mas acima de tudo é um filme corajoso. O cinema nunca foi tão celebrado como agora.



Direção: Michel Hazanavicius. Elenco: Jean Dujardin, Bérénice Bejo, John Goodman, Penelope Ann Miller


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sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Filme A invenção de Hugo Cabret



Hugo Cabret se passa em Paris dos anos 30 (Paris de novo!!), a primeira cena é um plano-sequência lindo sobre Paris que termina nos olhos do pequeno Hugo Cabret, o menino que observa a cidade atrás de um relógio na estação de trem Paris Nord como quem assiste a um filme.

A história tem todos os elementos pra ser uma obra prima, é baseado num best-seller com elementos reais, é metalinguistico (todo cinéfilo adora ver cinema falando sobre cinema) faz uma homenagem a um dos grandes pioneiros do cinema e tem a direção genial de Scorsese. Apesar de tantas conspirações a sensação é de que falta algo no filme, falta mais sentido, falta mais sintonia entre todos os elementos brilhantes incutidos.

A obra conta a história do filho de um relojoeiro (Jude Law) que morreu num incêndio, Hugo Cabret (Asa Butterfield) precisou morar com um tio alcolatra nos bastidores da Gare du Nord. Logo o tio desaparece mas Hugo continua a fazer o trabalho do tio pra evitar ir pra um orfanato. Torna-se um menino triste e solitário com um único desejo: fazer funcionar um robô que seu pai encontrou no lixo de um museu, se agarrando a esse que é o único elemento que o liga a pessoa mais importante de sua vida. Hugo busca no robô não só uma mensagem do seu pai mas um significado pra sua vida: “Se o mundo é como uma grande máquina, então eu não poderia ser uma peça extra. Eu tinha que estar aqui por um motivo.” Para sobreviver e terminar o concerto do robô ele comete pequenos furtos até que é pego pelo dono de uma loja de brinquedos, Papa Georges (Ben Kingsley). De imediato o expectador percebe que existe uma ligação entre o dono da loja e o robô quebrado.

Em A invenção de Hugo Cabret, o jovem Hugo acaba de tonando apenas um par de olhos azuis bonitos porque todo o foco do filme está em torno do mau humorado dono da loja que é na verdade o grande cineastra Georges Méliès, um dos pioneiros do cinema que, desiludido, se faz passar por morto e abre uma loja de brinquedos.

O filme traz alguns eventos verdadeiross, Méliès realmente trabalhava como um ilusionista e estava na plateia para a qual foram projetadas as primeiras imagens dos irmãos Lumiere. Ele se apaixonou pelo cinema e vendeu tudo o que tinha pra montar um estúdio de cinema, produzindo mais de 500 filmes em sua carreira. Viagem a Lua (Le voyage dans la Lune 1902) foi sua mais importante obra. Depois da guerra ele acabou falido (há discordância sobre os motivos) e indo trabalhar numa loja de brinquedos. Foi descoberto por jornalistas, recebeu algumas homenagens mas morreu pobre e sem o reconhecimento merecido.

Algumas narrativas se desenvolvem paralelamente a relação de Hugo com o velho dono da loja. O inspetor da estação de trem obcecado por encaminhar toda criança que ele encontra sozinha para o orfanato é interpretado por Sacha Baron Cohen. Ele se parece muito com um soldadinho de chumbo, tem uma perna deficiente e sua obsessão se justifica por ter, ele próprio, ter crescido em um orfanato. Esse poderia ser um aspecto interessante mas a ênfase em sua obsessão e as perseguições acabam ficando cansativas. A amizade entre Hugo e Isabelle (interpretada divinamente por Chloe Moretz) carece de um motivo start. Também não convence o motivo de tamanho desencanto do velho cineasta com sua arte. O robô, figura fascinante que tanto chama atenção no inicio do filme acaba se tornando semi-inútil no desenrolar da trama.

As interpretações são primorosas. Destaque pra rápida mas sensível atuação de Jude Law no papel do pai de Hugo, para a vara que Sacha Baron Cohen engoliu pra se manter tão ereto e, sobretudo  destaque para a grandiosa e marcante atuação de Ben Kingsley.

O filme tem um visual incrível. Segundo James Cameron, foi o melhor uso feito até então da tecnologia 3D. Independente de tecnologia a fotografia do filme é deslumbrante, a cidade de Paris escura como o coração dos personagens centrais, as cores que pulsam querendo saltar do cenário escuro, a luz quase mágica e o azul dos olhos do menino que Scorsese é mestre em retratar (lembra as cenas com ênfase aos olhos de Leonardo DiCaprio em O Aviador).

Além da fotografia o filme da uma aula de cinema homenageando o grande cineasta que mudou a história inserindo e seus filmes um elemento que está presente até hoje, a magia. A invenção de Hugo Cabret resgata cenas valiosas da obra de Méliès e é repleto de referências como o robô do Museu d´Art et D´Histoire na Suiça bem o epsódio do acidente ferroviário na estação de Montparnasse em 1895.

Os méritos do filme são tantos e tamanhos que superam suas pequenas carências, é um daqueles que não da pra não assistir. Scorsese retrata deslumbrantemente os primórdios do cinema francês, eterniza imagens preciosas e conta pro mundo porque o cinema é conhecido como fábrica de sonhos.



The Invention of Hugo Cabret. Direção: Martin Scorsese. Elenco: Asa Butterfield, Chloe Moretz, Jude Law, Helen McCrory, Ben Kingsley, Emily Mortimer, Christopher Lee, Sacha Baron Cohen, Ray Winstone.
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sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Filme MEIA NOITE EM PARIS




Um dos melhores filmes de Woody Allen, Midnight in Paris é encantador, nostálgico, culto, irretocável. Um filme que fala diretamente a alma humana, afinal quem nunca sentiu a estranha sensação de não pertencimento ao seu tempo e espaço? Quem nunca assistiu a um filme ou leu um livro antigo e não desejou ter vivido naquela época? Nesse filme Allen, um dos diretores mais psicanalíticos de todos os tempos, consegue mexer com o inconsciente, suas inquietações e vontades de forma absurdamente poética. 

Gil Pender é um roteirista hollywoodiano frustrado que anseia por mergulhar fundo na literatura. Ele viaja a Paris com sua noiva e a família dela mas aos poucos ele vai se distanciando deles e se aproximando cada vez mais da Paris dos seus sonhos e encontrando assim a oportunidade de entrega total a grande arte. No filme Wood Allen magicamente conduz seu personagem a Paris do passado e seu impossível encontro com Pablo Picasso, Salvador Dali, com os escritores Ernest Hemingway (Por Quem os Sinos Dobram), Scott Fitzgerald, Gertrud Stein, o músico Cole Porter, o cineasta Luis Buñuel e com sutis detalhes da arte de cada um.

Um mergulho na história que só seria possível numa cidade como Paris que preserva seu passado em cada rua, cada esquina, cada tijolo, cada cheiro No retrocesso tudo muda: os carros, os figurinos, a música. Somente Paris continua a mesma. Allen consegue transportar o personagem no tempo com uma sutileza incomum de forma que não causa nenhuma estranheza o personagem entrar num carro, voltar quase um século atrás e parecer que não tinha como ser diferente.

Allen e Paris combinam divinamente, em Meia Noite em Paris Allen conseguiu fazer um recorte estético da cidade luz ainda mais incrível que em Todos Dizem Eu Te Amo. As primeiras cenas do filme constroem um cartão postal dos lugares mais lindos da capital francesa. Em uma das cenas o personagem lê num livro “Que Paris exista e que alguém possa escolher viver em qualquer outra parte do mundo será sempre um mistério para mim.”

A trilha sonora é perfeita, a atuação de Marion Cotillard é encantadora, aliais tudo no filme se encaixa lindamente.  Midnight in Paris é uma celebração à beleza, à literatura e, sobretudo, à arte de fazer cinema.

P.S- Caso não seja familiarizado com a obra de Allen sugiro consultar outras fontes antes de assistir o filme. Esse texto é fruto de uma opinião altamente parcial, escrito por alguém em estado de graça com total identificação com história, por já ter se sentido deslocada no tempo e no lugar onde vive, alguém que ama o cinema, ama Paris e, assim como o personagem do filme, ama a chuva.



Diretor: Woody Allen Elenco:Kurt Fuller, Owen Wilson, Marion Cotillard, Michael Sheen, Tom Hiddleston, Kathy Bates, Rachel McAdams, Gad Elmaleh, Carla Bruni, Nina Arianda, Mimi Kennedy, Corey Stoll, Manu Payet Produção: Letty Aronson, Jaume Roures, Stephen Tenenbaum Roteiro: Woody Allen Fotografia: Darius Khondji Trilha Sonora: Stephane Wrembel


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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Fellini, 8 1/2


"Será que há algo tão claro e justo no mundo que mereça viver? Estamos sufocados por palavras, por imagens e por sons que não tem nenhuma razão de ser, que saem do nada e se dirigem para o nada. Que monstruosa presunção achar que seria útil para alguém o esquálido catálogo dos seus erros... E de que lhe adiantaria unir os farrapos de sua vida, suas vagas lembranças e os rostos daqueles que nunca soube amar?"

Do filme 8 1/2 do cineasta italiano Frederico Fellini. O filme é de 1963 mas as palavras nunca foram tão atuais.

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